Justiça suspende CPI da Educação por violação de Regimento; Leia a decisão

Mandado de segurança foi impetrado pelos vereadores Juninho Virgílio, Paulo Arantes e Fred Rangel




08/11/2023, 17h47, Foto: Divulgação.


Em ação impetrada pelos vereadores Juninho Virgílio, Paulo Arantes e Fred Rangel, a Justiça deferiu o requerimento, em caráter liminar, pela suspensão da CPI da Educação instaurada pela Câmara de Vereadores de Campos, em razão da violação do Regimento Interno do Legislativo, sobretudo pela não definição do objeto a ser apurado. Através de nota, a assessoria da Casa de Leis informou que a Câmara não foi notificada sobre a decisão. Veja a íntegra da decisão ao final do texto. (Leia mais abaixo)


A decisão do juiz titular da 4ª Vara Cível de Campos, Leonardo Cajueiro D´Azevedo, justifica: "o ato executivo 036/2023 que instituiu a “CPI da educação”, apontou como objeto de apuração 'a situação caótica da educação municipal' para, em seguida, de modo complementar, esclarecer 'a utilização dos recursos do FUNDEB, nas adesões de atas de licitações com valores suspeitos, nos aditivos de contratos e nas compras acima do mercado'. A primeira parte da motivação do ato é flagrantemente abstrata. Já a segunda parte, ainda sem definir exatamente o que será investigado (genérica), já inclui no objeto de investigação a certeza de irregularidades". 

Veja a íntegra da decisão:

Trata-se de Mandado de Segurança impetrado pelos vereadores PAULO SÉRGIO ARANTES DE OLIVEIRA, NEILTON VIRGÍLIO DE SOUZA JÚNIOR e FREDERICO DE MATTOS RANGEL apontando como autoridade coatora Presidente da Câmara Municipal de Campos dos Goytacazes, vereador MARCOS DA SILVA BACELLAR


Em síntese afirma violação a direito líquido de certo ver respeitado o devido processo legal para instauração e funcionamento de Comissões Parlamentares de Inquérito. Afirma que houve violação aos seguintes dispositivos legais: art. 58, §3º da CRFB, art. 31 da LOMCG e arts. 115, 116 e 118 do RICMCG. Sustenta que o ato (AE 036/2023) praticado pela autoridade coatora não preencheu as exigências da ordem jurídica para criação de CPIs, na medida em que:

1. 1- Não apontou fato determinado;

2. 2- Não fixou prazo certo para seu funcionamento”

O magistrado deferiu o pedido de liminar e assim fundamentou:

“O requerimento liminar deve ser DEFERIDO.


Inicialmente merece registro que o ato que se pretende suspender prevê expressamente no corpo do seu texto o prazo de 180 (cento e oitenta) para seu funcionamento e remete eventual prorrogação aos termos regimentais. Logo, quanto ao prazo de funcionamento da comissão temporária, não há vício a merecer reparo através do presente remédio constitucional.


Todavia, quanto à alegação de ausência de fato determinado a conclusão deve ser outra.


As CPIs desde o seu delineio constitucional submetem-se à exigência de apuração de FATO DETERMINADO. No presente writ há previsão regimental expressa (Art. 115 do RICMCG) no mesmo sentido.


Entretanto, o ato executivo 036/2023 que instituiu a “CPI da educação”, apontou como objeto de apuração “a situação caótica da educação municipal” para, em seguida, de modo complementar, esclarecer “a utilização dos recursos do FUNDEB, nas adesões de atas de licitações com valores suspeitos, nos aditivos de contratos e nas compras acima do mercado”.


A primeira parte da motivação do ato é flagrantemente abstrata. Já a segunda parte, ainda sem definir exatamente o que será investigado (genérica), já inclui no objeto de investigação a certeza de irregularidades.


“Como é cediço, fato determinado é aquele que não se afigura vago, genérico, abstrato ou inespecífico. Logo o objeto da CPI deve ser um fato determinado, cuja descrição deve informar, com clareza e precisão, elementos que remetam à certeza e delimitação do objeto, de modo a balizar a atuação de seus trabalhos.” (TJRJ, RNMS 0013457-49.2018.8.19.0007).


A exigência tem por escopo delinear o fato-alvo a ser investigado, de modo traçar a rota de trabalho da comissão.


No presente writ temos prova documental pré-constituída (procedimento administrativo interna corporis que embasou o ato aqui impugnado, index 85590353) do qual se pode inferir atos específicos a serem investigados (fls. 05, 06 e 08). Porém, o ato de criação da CPI não os especificou. Doutra parte, no index 85590354, temos demonstração da vagueza no rumo da investigação dada a generalidade e o vasto recorte temporal das solicitações contidas no ofício de fls. 02 e 03.


Pelas razões acima expostas, reputo presente o fumus boni iuris necessário a concessão de liminar. Reputo, ainda, presente o periculum in mora, haja vista termos comissão instaurada fora de parâmetros legais (em cognição preliminar e precária) praticando atos administrativos (index 86130174 e 85590354) com base em Ato Executivo de legalidade duvidosa (insistase) a atingir esfera jurídica de terceiros fora do devido processo legal.


Faz mister trazer fragmento de texto estudado quando de nosso curso de doutorado, com preciosa lição dando conta de que nem sempre a CPI “é instaurada exclusivamente com o fim de apurar irregularidades: muitas vezes uma CPI é instala para se angariar benefícios eleitorais ou prestígio com um grupo de interesse; como estratégia da oposição para desgastar a imagem do governo; para se conseguir benefícios políticos, de barganha com o governo; como forma de pressionar outro grupo a retardar ou suspender investigações em outra arena, até mesmo outra CPI; para impedir a instalação de outra comissão, dado o limite de cinco CPIs trabalhando simultaneamente”. LEMOS. O controle legislativo no Brasil pós-1988.


In: Instituições representativas no Brasil: balanço e reforma (Orgs. NICOLAU, Jairo, Timothy J.), p. 46. Essa é a razão pela qual nossa ordem jurídica impõe em diversas oportunidades a determinação do fato investigado (art. 58, §3º da CRFB, art. 109, § 3º da CERJ, art. 31 da LOMCG e art. 115 do RICMCG) com o propósito de condicionar a atuação da comissão dentro do interesse público uma vez que os atos estudados pela ciência política, em termos de direito administrativo, importariam em desvio de finalidade.

Portanto, pelas razões acima expostas, em caráter liminar, em cognição preliminar e precária, sem que importe em vinculação a futura decisão definitiva de mérito, faz-se necessário suspender os efeitos do Ato Executivo Nº 36/2023 que instalou a CPI da Educação.

Pelo que foi exposto,

1. 1- DEFIRO o requerimento liminar para SUSPENDER OS EFEITOS DO ATO EXECUTIVO Nº 36/2023 que

instalou a CPI da Educação;

2. 2- Notifique-se o impetrado, com urgência e pelo OJA de plantão, NA FORMA do art. 7º, I da Lei 12.016/2017 para

que no prazo de 10 (dez) dias, preste as informações;

3. 3- Intime-se o órgão de representação judicial da Câmara Municipal de Campos dos Goytacazes, para, querendo,

ingressar no feito;

4. 4- Apresentadas as informações, ou transcorrido o prazo, ao MP, conforme exigido pelo art. 12 da Lei 12.016/2017,

para que opine no prazo de 10 (dez) dias;

5. 5- Após, conclusos na forma do art. 12, parágrafo único da Lei 12.016/2017.

CAMPOS DOS GOYTACAZES, 8 de novembro de 2023.

LEONARDO CAJUEIRO D AZEVEDO

Juiz Titular