Bullying: combate deve ser feito de forma coletiva e intersetorial

Um em cada três alunos em todo o mundo já sofreu este tipo de ofensa




08/04/2023, 08h17, Foto: Divulgação .


De acordo com a Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (Unesco), um em cada três alunos em todo o mundo já foi vítima de bullying. Esse tipo de violência, ainda comum nas escolas, segundo o órgão, gera consequências arrasadoras no desempenho escolar dos alunos, além de graves consequências negativas para a saúde física e mental das crianças. Hoje (7) é comemorado no país o Dia Nacional de Combate ao Bullying e à Violência nas Escolas (leia mais abaixo)


No Brasil, pesquisa feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2021 aponta que 23% dos estudantes afirmaram já terem sido vítimas de bullying, ou seja, sentiram-se humilhados por provocações feitas por colegas.(leia mais abaixo)


Para combater esse tipo de ofensa no país, o governo brasileiro instituiu em 2015 o Programa de Combate à Intimidação Sistemática. "A lei objetiva prevenir e combater a prática do bullying no Brasil. A lei prevê o preparo da comunidade escolar para o desenvolvimento de ações preventivas, bem como a identificação e a administração das situações de bullying que ainda ocorrerem", disse Zeyne Alves Pires Scherer, professora associada da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo.(leia mais abaixo)


De acordo com a lei, "é dever do estabelecimento de ensino, dos clubes e das agremiações recreativas assegurar medidas de conscientização, prevenção, diagnose e combate à violência e à intimidação sistemática".(leia mais abaixo)


Apesar da lei não determinar punições ou cobranças para os estabelecimentos que não tomarem medidas de prevenção ao bullying, diversas organizações, educadores e escolas de todo o país estão elaborando e aplicando estratégias para trabalhar esse grave problema. As estratégias são diversificadas, mas todas elas demonstram que para combater o bullying é necessário que as ações sejam realizadas de forma coletiva e intersetorial.(leia mais abaixo)


“É importante que toda a comunidade escolar esteja mobilizada em torno desse assunto. Qualquer estratégia de prevenção à violência nas escolas pede uma sensibilização, uma mobilização e participação de toda a comunidade escolar, não só dos envolvidos. E não é tão eficaz que as intervenções sejam separadas das dinâmicas gerais da escola”, disse Maria Fernanda Tourinho Peres, professora do Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e coordenadora do Laboratório Interdisciplinar de Estudos sobre Violência e Saúde (Lieves).

“Outra coisa importante também é que o problema da violência, e isso inclui a violência juvenil e que acontece dentro ou fora da escola, não será resolvida só pela escola. É até injusto exigir ou esperar que a escola dê conta de um problema tão complexo sozinha. É claro que a escola ganha relevância porque os adolescentes e as crianças passam grande parte dos seus dias nas escolas. Mas isso não significa - e não é eficaz pensar – que apenas a escola é responsável por prevenir essas questões ou interferir nessas situações. Quando falamos em prevenção da violência - e bullying é um tipo de violência - a gente reconhece e recomenda a construção de ações que sejam intersetoriais. Há que ter a participação da escola, do setor da saúde, da assistência social, dos conselhos tutelares. Hoje em dia, essa rede territorial e esse fluxo não estão bem estabelecidos. Nenhum setor vai dar conta sozinho desse problema”, disse Maria Fernanda.


Boas experiências

A Agência Brasil buscou experiências públicas e privadas que têm se mostrado bem-sucedidas no combate a essa grave forma de violência e que têm demonstrado que o bullying pode ser prevenido, principalmente se as estratégias levam em conta a coletividade e a participação compartilhada.


Uma dessas estratégias foi elaborada pela professora Zeyne Alves Pires Scherer, uma das criadoras de uma cartilha para ajudar profissionais a lidar com essa forma de violência nas escolas. O material foi elaborado a partir de discussões com pesquisadores do Grupo de Estudos Interdisciplinar sobre Violência (GREIVI) da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da USP; do Observatório Permanente Violência e Crime da Universidade Fernando Pessoa, de Portugal; e dos resultados de um projeto de extensão universitária da USP.


“Acredito que a cartilha, como um material educativo, pode contribuir não só como meio de divulgar conhecimento sobre as ações de intervenção e prevenção da violência bullying no meio escolar, mas também conscientizar, discutir e alertar a sociedade para esse fenômeno psicossocial”, disse ela.


Soltando a Voz

Já na Escola Estadual Ministro Waldemar Pedrosa, localizada em Parintins (AM), um projeto vem sendo desenvolvido desde 2019 para aumentar a autoestima dos alunos e melhorar o ambiente escolar. Criado pela professora Mary Sônia Dutra de Alencar, o projeto foi chamado de Soltando a Voz, Eu tô Melhor Agora! e vem sendo realizado de maneira interdisciplinar com as turmas do quarto e quinto anos do ensino fundamental.


“O projeto tem a finalidade de inserir hábitos saudáveis num ambiente de convívio mútuo, incentivando a autoestima das crianças a partir da representatividade, e promovendo a integração e o desenvolvimento de valores, por meio de ações de prevenção, promoção, atenção à saúde e do protagonismo infantil”, disse Mary Sônia. Com a ação, diz a professora, as crianças discutem e protagonizam campanhas educativas para informar e orientar sobre os malefícios do bullying.


À Agência Brasil, Mary Sônia disse que o projeto abriu a “possibilidade de compreensão por parte das crianças com relação à forma na qual raça, identidade, representatividade e bullying se interligam de forma depreciativa”.


“Compreender essa dinâmica aponta os caminhos que a Escola Estadual Ministro Waldemar Pedrosa buscou para o enfrentamento dos apelidos, xingamentos e racismo”, relata.


Segundo a educadora, o projeto foi buscar inspiração na pedagogia desenvolvida pelo psicólogo e pensador Jean Piaget (1896-1980) e na educação problematizadora do educador e filósofo brasileiro Paulo Freire (1921-1997). “As atividades propostas foram direcionadas às crianças no intuito de problematizar as diferentes situações vividas, observadas e comentadas pelos pares, colegas de turmas e amigos e nos valores apresentados pelas mídias sociais”, explicou.


O projeto foi dividido em etapas. Na primeira delas, foi feita uma assembleia para que as crianças falassem sobre a convivência delas na escola. Nessa etapa também foi feito um levantamento de situações de desafetos, agressões e de violência que tenham ocorrido no ambiente escolar e foi apresentado o termo bullying.


Na segunda etapa, as crianças entraram em contato com a lei federal de combate à intimidação sistemática e fizeram entrevistas com funcionário da escola para saber se eles já presenciaram algum tipo de bullying em sua época escolar.


Nas etapas seguintes, eles trabalham com textos sobre o bullying e começam a propor soluções para enfrentar esse problema. Nessa etapa, as crianças também elaboram textos informativos para conscientizar a comunidade escolar sobre o bullying.